Planeta Sensu

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quinta-feira, dezembro 08, 2005

Rumo ao Decrescimento? Será Exequível?

Esta reflexão adveio da leitura de um artigo de Serge Latouche, "Rumo ao Decrescimento, Ecofascismo ou Ecodemocracia", publicado no "Le Monde Diplomatique" (edição portuguesa) de Novembro de 2005. Primeiro, reflictamos acerca da globalização e do capitalismo, especialmente na pacífica (ou não) época natalícia.

Nos dias que correm, as sociedades estão quase na sua totalidade, sujeitas aos dois processos, sendo praticamente impossível não estarem dependentes da maioria dos produtos que as superfícies de consumo, online inclusive, lhes disponibilizam. Podemos, no entanto, cingir-nos ao consumo dos produtos indispensáveis, não nos deixando levar ao consumo descomedido que as grandes superfícies comerciais e as enormes empresas mundiais pretendem que façamos, através do bombardeamento publicitários exercido nos media.

Em época natalícia, supostamente pacífica e solidária, o consumo global multiplica-se, assim como a artilharia publicitária, e todas as superfícies comerciais se aperaltam para o consumo abusivo exercido por clientes ansiosos pelas monstruosas compras de natal e por, no final, ouvirem a despedida final do empregado da superfície comercial: Adeus, Obrigado, Boas Festas!

Será que a maioria dos consumidores está consciente que o fabrico dos produtos, desenfreadamente consumidos, consome também ele recursos naturais, que um dia se extinguirão?

Recorramos então ao documento, refere este que o projecto de construção de sociedades mais autónomas e sem detrimento dos recursos encontra, actualmente, uma larga adesão e que, apesar de os seus defensores apresentarem medidas diferentes, todos admitem que é urgente atenuar a pressão ecológica, baseando-se no escrito de John Stuart Mill, no qual este refere que "Todas as actividades humanas que não impliquem um consumo irracional de materiais insubstituíveis ou que não degradem de forma irreversível o ambiente poderiam desenvolver-se indefinidamente. Sobretudo actividades que muitos consideram como as mais desejáveis e as mais satisfatórias - como a educação, a arte, a religião, a investigação fundamental, os desportos, as relações humanas - poderiam tornar-se florescentes"1

Alguém racional e consciente contesta a salvaguarda do ecossistema, do ambiente, da fauna e da flora?

Não me parece que alguém o faça, no entanto, para a maioria, não passa de um processo mental. É preciso passar à acção criando, segundo Serge Latouche, um decrescimento do consumo capitalista, de forma a desencadear uma sociedade "ecompatível", através de uma educação ecológica. Não estou ver nenhum político, nem nenhum presidente de alguma mega-empresa a alterar radicalmente o sistema económico que regula o mercado, de modo a encarrilar, finalmente, por um ecocapitalismo; estão demasiado ocupados com a gerência do governo e da empresa, esquecendo que a absorção desenfreada dos recursos, destrói, polui e devora o ecossistema. É necessário inculcar, globalmente uma consciência ecológica em todas as sociedades, criando simultaneamente pesadas coimas para os incumpridores.

Mas, não será isso extraordinariamente utópico? De facto é. Serge Latouche refere a resposta tradicional de uma extrema-esquerda. Evitando qualquer tipo de dogmatismo, que não permita a compreensão dos verdadeiros obstáculos que se levantam, o autor questiona se o primeiro passo rumo ao decrescimento não será adormecer os "gigantes capitalistas", causadores de todas as debilidades e impedimentos. Será possível conceber um capitalismo "ecompatível"? Latouche refere que, ainda que sendo teoricamente conceptível, é na prática fantasioso. Imporia normas vigorosas, que permitissem a redução da agressão ecológica. Deste modo, conclui o autor que, uma sociedade baseada no decrescimento não será exequível sem que antes se abula o capitalismo.

Mas para além desta abolição irrealizável, que mais poderá ser feito para reduzir a agressão ecológica? O autor refere medidas elementares que, através dos círculos íntegros do decrescimento, permitiriam avançar para um simples "programa reformista de transição", contendo medidas como:

-Reencontrar uma produção material igual à dos anos 60 e 70;
-interiorizar os custos dos transporte, relocalizando as actividades;
-restaurar a agricultura camponesa;
-estimular o fabrico de bens relacionais;
-abrandar o desperdício de energia a um quarto;
-penalizar fortemente as exorbitantes despesas da publicidade;
-decretar uma moratória na inovação tecnológica, realizando um balanço sério e reorientando a pesquisa científica e técnica em função de novas pretensões;

Refere, ainda, que este projecto se centraria no que chama, internalização das "deseconomias externas"2 que, em princípio, segundo a teoria económica rigorosa, possibilitaria a criação de uma sociedade de decrescimento. Utopia novamente? Já não tanto, como a abolição do capitalismo, mas ainda assim, não são medidas de fácil aplicação, pois impõem uma perversão do actual estado do mercado. Reduzir a produção material de mega-empresas originaria, com certeza, milhões de desempregados e prorrogar o desenvolvimento tecnológico impossibilitaria avanços ao nível da medicina, por exemplo.

O que fazer então para salvaguardar a defesa do ecossistema vital à sobrevivência? Não tenho resposta mais real e exequível do que a educação ecológica, criadora de uma consciência ecológica, o mais propagada possível e, também a adopção mais forte de diversas energias alternativas e renováveis, reduzindo progressivamente o consumo de petróleo. No entanto,
esta redução não é fácil de adoptar já que o ouro negro está demasiado intrínseco na sociedade e demasiado dependente de "Lobbies".

Se num futuro próximo, não aparecerem opções activas que permitam a modificação do actual estado das coisas, serão necessários grandes abalos ecológicos e que os recursos, actualmente em uso, se esgotem para finalmente se encaminhar, se não for tarde de mais, o modo de sobrevivência humana "produção". Até lá, certamente haverá muita azáfama consumista natalícia, muita produção, muito consumo, muita degradação "ecossistémica", muito enriquecimento para poucos e muito empobrecimento para muitos.

Adeus, obrigado, e boas festas para todos (acompanhado de um sorriso modelar ou continental de uma menina caixeira).

1 - Principes d´economie politique, Dalloz, Paris, 1953, p.297


2- Prejuízos engendrados pela actividade de um agente que os impõe à colectividade.

1 Comments:

At 12/09/2005 1:44 da manhã, Blogger Alexandre Figueiredo said...

Meu caro amigo....
Não deixes morrer o teu projecto. Não te sintas nunca na obrigação de escrever. Fá-lo apenas quando te apetecer, quando estiveres a fim. Lembra-te que, talvez daqui a 50 anos possas olhar para este conjunto de textos e conhecer mais a respeito de ti mesmo, como cresceste, qual o teu estado de espírito em dada altura...
Os blogs, ao contrário do que muitos pensam são muito mais do que espaços de opiniao ou de divulgação. São um diário. Público, mas muito nosso, porque só nós sabemos o que cada palavra significa, para nós....
Recebe um abraço de estímulo deste amigo...

 

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